A plantação é um acto singelo
damos algo à Natureza, e nesse momento não recebemos nada de retorno.
A retribuição pode-nos ser dada mais tarde. É profundamente gratificante ver nascer da terra, as árvores que anteriormente plantámos, e vê-las crescer ano após ano!
Num projecto de reflorestação ecológica de baixa densidade, a sobrevivência de cada planta torna-se muito importante.
Veremos na página sobre o método da plantação, a descrição do procedimento e a justificação técnica das opções tomadas para a especificidade do mesmo. Julgamos ser a melhor forma de assegurar uma taxa de sobrevivência o mais elevada possível.
Na Natureza, as árvores produzem milhares de sementes. Todos os anos.
E apenas uma pequeníssima fracção dessas sementes consegue chegar ao seu objectivo individual de criar uma nova árvore. O objectivo colectivo de todas as árvores de uma floresta não será de todas as sementes chegarem a árvore. O objectivo da Natureza é de se sustentar, e a quantidade de sementes está feita de acordo com as ‘perdas’ (chamemos-lhe antes ‘desvio’ - que na Natureza nada se perde. Quase todas as sementes são desviadas para alimentar o solo, outras plantas, e os aminais). Esta situação aplica-se a um ecossistema vivo e activo, e a Natureza mantém-se em equilíbrio.
No processo aqui encetado, não há árvores a produzir milhares de sementes todos os anos. Não há nenhum ecossistema florestal, no Vale da Candeeira, como devia haver… Recolhemos sementes das espécies que compõem a floresta que outrora lá existiu, de árvores o mais próximo possível do vale. Vamos plantar novas árvores, para o ecossistema da floresta da Candeeira poder recomeçar. Começar ‘do zero’.
A última vez que a Natureza começou a criar o ecossistema da floresta de carvalhos, foi quando o clima aqueceu depois da última Idade do Gelo. Nessa altura havia imensas florestas nas terras baixas a Sul da Serra da Estrela e não havia pessoas a desequilibrar a Natureza, com agricultura, poluição e incêndios.
Referência sobre a ‘regeneração espontânea’ no final da última Idade do Gelo:
v.d. Knaap, W. O., v Leeuwen, J. (1997): Late Glacial and early Holocene vegetation succession, altitudinal vegetation zonation, and climatic change in the Serra da Estrela, Portugal. Rev. Paleobotany and Palynology. Vol. 97, 239-285. Elsevier.
Da última vez que a floresta recomeçou na Candeeira demorou mais de 500 anos a estabelecer-se.
Temos que assegurar que desta vez demore menos tempo…
Imagem de uma montanha (‘Half Dome’, Yosemite, Sierra Nevada, California, EUA).
A imagem não é minha, é uma ‘stock foto’ cedida pelo alojamento do site na internet.
Para aumentar as nossas probabilidades, há que começar antes do início.
A Natureza não é perdulária.
Quanto mais dificil e agreste o ambiente, menos Ela nos perdoa e mais nos castiga pelos nossos erros.
Em regiões de montanha, normalmente um pouco mais frescas e com o ar um pouco mais rarefeito, as amplitudes térmicas são mais acentuadas, a seca mais notória, as chuvas mais intensas, o vento mais forte e a passagem das estações do ano mais nítidas.
As montanhas são um mundo mais difícil. A Serra da Estrela, apesar da sua altitude não ultrapassar sequer os 2000 metros, a sua proximidade do Oceano Altlântico, os seus vales profundos à volta de um planalto central e a sua posição entre o ambiente temperado e o mediterrânico fazem desta montanha um desafio complexo, numa situação de repovoamento florestal.
Por isso, a margem de manobra, antes da Natureza nos castigar é muito reduzida.
E a margem de erro é zero.
Os meses que ocupam mais tarefas com preparação de plantas - poda e recolha de estacas e sementes, germinação, criação de raízes em estacas, plantação em couvetes / raízes em torrão - são os meses do início da Primavera e durante o Outono.
Com a conclusão dos trabalhos de construção de represas de água, o Verão será utilizado para preparar as covas de plantação:
abertura e limpeza de clareiras,
criação de covas individuais para plantação
Descrição mais aprofundada destas tarefas está na página sobre o método da plantação.
A parte complicada já está feita.
Agora só falta a parte trabalhosa ;-)
O trabalho de plantação tem duas componentes:
Selecção de espécies (esta página),
Plantação de árvores (link para outra página).
O processo de selecção de espécies a plantar em cada área e em cada local tem de ser objectivo, padronizado, versátil e eficaz.
O processo de plantação tem de ser rigoroso, uniforme e simples.
A plantação: selecção de espécies.
Para manter a versatilidade na selecção da matriz de espécies a juntar em cada área de plantação e ao mesmo tempo manter uma elevada objectividade de critérios, definimos algumas das características principais de cada espécie identificada nos estudos polínicos dos lagos/turfeiras da Serra. São características como a maior ou menor resistência à secura sasonal do solo, à exigência de nutrientes no solo, à exigência de radiação solar (luz/sombra) ou resistência ao frio e às geadas na época de crescimento, para exemplificar.
Referência sobre as características (exigências, sensibilidades e limitações) de cada espécie de árvore: utilizou-se o Atlas das Árvores das Florestas da Europa.
de Rigo, D., Caudullo, G., Houston Durrant, T., San-Miguel-Ayanz, J., (2016): The European Atlas of Forest Tree Species: modelling, data and information on forest tree species. In: San-Miguel-Ayanz, J., de Rigo, D., Caudullo, G., Houston Durrant, T., Mauri, A. (Eds.), European Atlas of Forest Tree Species. Publ. Off. EU, Luxembourg, pp. e01aa69+
Estabelecemos uma forma simples e empírica de avaliar a qualidade do solo em cada local, com base na observação da tipologia do coberto vegetal actual.
Definiu-se a quantidade de plantas de cada espécie, de acordo com os estudos polínicos, e as suas densidades relativas, por partes do vale - encosta norte ou sul.
Adaptámos as características das árvores à classificação do solo com a definição de uma matriz que atribui uma mistura aproximada de espécies por áreas, que são plantadas a partir da matriz de plantas, com selecção de espécie de acordo com a tipologia do solo em cada local.
Na escolha da espécie a plantar em cada cova, devem-se ter em consideração as características de cada espécie:
a azinheira resiste melhor à falta de água e é menos sensível às condições do solo (humidade, nutrientes)
o freixo é mais exigente relativamente à qualidade do solo e à disponibilidade de água.
A aveleira e o sanguinho são as duas espécies de sub-bosque com mais representatividade nas análises polínicas. Serão plantadas em maior quantidade.
a aveleira resiste melhor ao frio
o sanguinho exige mais humidade
o teixo resiste melhor à secura e à sombra
o azevinho resiste mal à secura
o loureiro exige melhor qualidade de solo
Nos 5 a 10 metros mais próximos das linhas de água deve-se fazer plantação com amieiro, independentemente da altitude e da exposição. Nas águas perenes (que mantêm água em superfície até final do Verão) podem-se plantar salgueiros junto da água. Plantas de sub-bosque: sabugueiro entre os salgueiros e sanguinho entre os amieiros.
a azinheira e o teixo podem ser plantados a maior distância das linhas de água, e na encosta norte.
a aveleira e o sanguinho podem ser plantadas até maior altitude e em locais mais frios/sombrios - toda a encosta sul e evitar a parte inferior da encosta norte.
o freixo, o sanguinho e o azevinho devem ser plantados em locais com mais disponibilidade de água
o freixo e o loureiro devem ser plantados em locais com ‘garantia’ de existência de solo orgânico em profundidade (procurar núcleos de giestas arbóreas, como indicador).
A giesta é mais exigente quanto à existência de nutrientes no solo, quando comparada com as urzes. São as duas plantas que constituem o coberto vegetal actualmente no Vale da Candeeira. A giesta é, por isso, o melhor indicador da presença de bolsadas com antigos solos florestais, ou de solos orgânicos com alguma profundidade. Serão por essa mesma razão usadas de forma preferencial como ‘árvores de amamentação’ (árvores de encosto e guarda-vento) e não são cortadas na plantação. Com o início do crescimento das árvores, far-se-á o corte gradual das giestas.
Os dados sobre as características das espécies arbóreas do Atlas Europeu de árvores (acima referenciado) foi suplementado com informação de
Pinho, J., Santos, C., Sampaio, G., (2020): Árvores indígenas em Portugal Continental (Guia de utilização). 42 p., ICNF, Portugal.
Principalmente no seu capítulo 3: Orientações para o planeamento das arborizações, as informações são da maior importância, visto o Projecto Candeeira Verde se desenvolver precisamente dentro de uma área protegida - o Parque Natural da Serra da Estrela. Respeitamos sempre as normas e épocas estipuladas nessa publicação.
Várias publicações informam sobre as exigências de cada espécie, tanto relativo às exigências do ambiente climático e, mais raramente, sobre as exigências relativas ao ambiente edáfico - as condições e particularidades do solo. São informações úteis e, se não forem respeitadas, determinam à partida, a falha do trabalho executado.
Há igualmente publicações que informam sobre as condições ambientais: conhecemos o clima da Serra da Estrela, em traços muito largos. As suas particularidades, os microclimas, desconhecemos por via da publicação divulgada. O ‘clima’ é, por definição, o estado médio da atmosfera e é sempre avaliado como resultado de séries prolongadas de décadas ou várias décadas (as ‘normais climatológicas’ são sempre calculadas a partir de séries de 30 anos). O conhecimento sobre as condições do solo resulta, como o solo ‘per se’, da acção do clima sobre a rocha subjacente: o ‘solo’ é sempre o resultado do substrato rochoso alterado ao longo do tempo pelas condições atmosféricas, principalmente no que respeita à temperatura e humidade.
Sabemos que a Serra da Estrela, na parte que se aplica ao Vale da Candeeira, tem solos classificados como ‘Leptosol’ ou ‘Ranker’, mas de pouco serve no momento de plantar cada árvore na sua cova. Também sabemos que a rocha subjacente maioritariamente é um granito de grão grosseiro de feldspato ortoclásico e que o clima é classificado como oromediterrânico sub-atlântico. Não iremos aqui decompôr todos estes termos - quem quiser saber, que procure na wikipédia, que é dos melhores sítios para obter informações e esclarecer termos técnicos.
As classificações mencionadas, tanto do solo como do clima, são gerais. Indicam-nos o tipo de solo e de clima que será expectável existir na maior parte do vale. No momento de enterrar uma planta na sua cova, o importante é saber se o solo retém a humidade do Inverno ou não. Se existe gravilha e rocha intacta a 30 cm de profundidade ou se há terra húmica até um metro de fundo. Se o local está exposto ao sol, principalmente entre as 12h e as 16h ou se tem uma rocha ou uma planta que lha possa fazer sombra (e, no caso de estar exposto ao sol, se a alguns centímetros já terá sombra…)
Estas são as questões que têm de ser respondidas no momento de abrir a cova no chão, no momento de abrir o local de vida para um ser vivo durante muitas décadas. De assegurar que nesse local exacto há condições para que determinada espécie de árvore consiga sobreviver.
Sabemos as exigências das espécies que vamos plantar. São parecidas, mas não são iguais. Por isso, todas cresceram e viveram no Vale da Candeeira. Mas cada espécie tem exigências ligeiramente diferentes, o que significa que cada uma terá tido ‘o seu nicho’.
E terá que ter outra vez. Há que o encontrar…
Normalmente, as árvores são bastante tolerantes; umas mais do que outras. É essa tolerância que teremos de saber aproveitar, para utilizar de forma optimizada, o espaço destinado a plantar. Às espécies menos tolerantes teremos de dar condições mais próximas do seu ideal; as espécies mais tolerantes podemos plantar em locais menos ideais.
